Dos palcos cariocas, a ausência era de praticamente dois anos. Nas rádios, porém, a freqüência esteve garantida por nada menos que cinco hits consecutivos tirados do último LP - Quatro Estações vendeu mais de quinhentas mil cópias desde seu lançamento em outubro passado. Levando em conta esses antecedentes, o que se pode esperar dessa apresentação única da Legião Urbana? Caos generalizado, é claro.
Desde cedo, um engarrafamento se estendia pelas vias de acesso ao Jockey Club Arena, no hipódromo da Gávea. Se, em dias comuns, essa área já costuma ficar congestionada, imagine cerca de cinqüenta mil pessoas tentando chegar ao mesmo tempo, ao mesmo lugar. Mais parecia um trecho de Guerra Dos Mundos: carros abandonados, pessoas correndo pelo meio da rua, policiais em desatino, gritos histéricos.
Bastou entrar no Jockey para perceber que a via crúcis não terminara. O público aboletou-se onde pôde; invasões não foram evitadas. Mesmo com algumas adaptações, o local não abriga um show de rock com a mesma generosidade que oferece a uma corrida de cavalos. Difícil crer que o ilustre Tom Jobim, depois de um auto-exílio declarado, inaugurou este "novo espaço para shows" com uma apresentação no início deste ano.
Ver a banda era privilégio de poucos. Sim, havia telões -
insuficientes para abranger 23 mil metros quadrados. OK, resta o som, ou
melhor, a voz e a caixa da bateria! Conhecendo todas as músicas de cor e
salteado, por que haveria a platéia de se importar com tudo isso? Surpreendente
mesmo era quando, nos intervalos, as palavras proferidas por Renato (cada vez
mais falastrão), ainda que incompreensíveis àquela distância, ganhavam
entusiásticos aplausos. Falasse em grego e o resultado seria idêntico. É de
impressionar a catarse coletiva que a Legião provoca.
Em contraponto ao
desvario da audiência, a banda, reforçada por mais três componentes (Mu nos
teclados, Fred no violão e Bruno no baixo), mantinha a situação sob rédeas
curtas, escaldada em dezesseis apresentações anteriores. Em nada lembrava o
cansaço da última turnê. Até Dado saiu de seu habitual estado letárgico para
arriscar alguns passeios.
Entre uma dança,
cigarros e troca de camisas, Renato compôs uma atuação fulgurante: da homenagem
póstuma a Cazuza, incluindo versos de "Blues Da Piedade" e "Faz
Parte Do Meu Show" e "Soldados" ao arremesso de flores brancas à
platéia. Só não tolera barbarismos. Quase ao fim do espetáculo, uma chuva de
areia vinda do público atinge o palco, deixado logo em seguida pela banda. Mas
não é qualquer "miguel" que vai acabar com a festa. De luzes acesas,
Renato volta, ao lado de um representante da Defesa Civil e, na base da
catequese, acalma os ânimos e prossegue com o bis.
O "grand finale" viria com uma explosão de fogos
de artifício ao som de Rhapsody In Blue, de Gershwin. "Um clima meio
Disneylândia", na opinião do nosso fotógrafo Ricardo Siqueira.
Quando tudo parecia
enfim terminado, com a multidão combalida já deixando a Arena, a voz de Renato
ecoou ao microfone anunciando: "Gente, olha a Lua!!!" Milhares de
cabeças se voltaram para o céu e constataram: era noite de lua cheia. E não
poderia ser outra...
LORENA CALABRIA
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