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quarta-feira, 21 de novembro de 2012

DOORs - Historia da banda


"Will he Stink Carried heavenward thru the hall of music?
No chance"

(Será que ele vai feder ao ser carregado ao paraíso através
dos salões da música? Sem chance")

Estes versos faziam parte do poema Ode To L.A.While Thinking of Brian Jones, Deceased, escrito por Jim Morrison em novembro de 1969 em homenagem ao ex-guitarrista dos Stones, encontrado morto na piscina de sua própria casa em julho daquele ano. Eles poderiam muito bem se aplicar ao autor: afinal, desde que Jim sofreu uma ataque cardíaco fatal na banheira de um apartamento em Paris na madrugada de 3 de julho de 1971 - exatamente dois anos após a morte de Brian Jones -, o espirito de sua obra, especialmente à frente dos Doors, e o culto de sua imagem continuam vivos e cada vez mais influentes no rock contemporâneo. Fato esse que fica atestado não só pelos álbuns dos Doors continuarem vendendo em torno de 400 mil cópias anuais em plena década de 90 como o interesse despertado pelo material inédito lançado postumamente. Além disso, foram dezenas de bandas que se referenciaram em sua concepção musical - das quais Echo & The Bunnymen seria o exemplo mais característico -, que se sucederam à influência exercida pelo trabalho de Jim na poética e nas performances de Iggy Pop e Patti Smith, entre outros, nos anos 70. 


Lógico que seria um equivoco menosprezar a contribuição das outras três "portas" - o tecladista Ray Manzarek, o baterista John Densmore e o guitarrista Robby Krieger - na avançada concepção musical do grupo, agressiva demais para a Califórnia em meados dos anos 60, que testemunhava o pleno florescimento do pscicodelismo de bandas como Jefferson Airplane e Grateful Dead e a consolidação do country rock por intermédio dos Byrds e do Buffalo Springfield. Boa parte dessa alquimia sonora dos Doors deveria ser creditada aos três instrumentistas do grupo, mas é inegável que essa força catalisadora em estado bruto provinha das letras e dos vocais de Jim. Enquanto porta-voz da filosofia dos Doors, ele declarava "estar interessado em tudo que dissesse respeito à revolta, desordem, ao caos e especialmente a atividades que não fizessem sentido". Esse lema sintetizava a postura do grupo, em que Jim, tal qual um xamã alucinado, conduzia o público ao frenesi através de suas performances, gerando uma espécie de cartase coletiva freqüentemente associada por ele próprio à tragédia clássica grega e ao Carnaval do Rio. O seu extraordinário carisma, aliado a uma inteligência aguçada, e uma grande carga de senxualidade transformaram Jim em "sonho americano" durante a segunda metade da década de 60, e sob esse epíteto, Jim conheceria o caminho da ascensão e da glória, que seria seguido no tempo de sua vertiginosa queda.

A Educação Sentimental - James Douglas Morrison nasceu em 8 de dezembro de 1943, na cidade de Melbourne, na Florida. Seu pai, Steve Morrison, era um jovem oficial em início de carreira na Marinha e apenas seis messes após o nascimento de Jim foi convocado para servir nas forças americanas em manobras pelo Pacífico, onde só retornou em meados de 1946. Neste meio tempo, Jim viveu na casa de seus avós paternos em Clearwater, em companhia de sua mãe, Clara Clarke. A rígida educação metodista a que Jim foi submetido nos primeiros anos de infância foi acrescida com a severa disciplina quase militar imposta pela volta do pai, o que contribuiu para gerar em Jim um ódio intrínseco a qualquer espécie de autoridade. Junto a isso, ele cultivava uma espécie de isolamento em relação as outras crianças de sua idade, em parte por sua timidez, em parte pelas constantes mudanças às quais sua família era submetida, de acordo com as bases para as quais o seu pai fosse destacado.

Depois de passar pela cidade de Washington e pelo Novo México, em 1957, os Morrison fixam-se na Alameda, ao norte da Califórnia. A essa altura o família já contava com mais um casal de crianças - Andrew e Ann -, mas foi o filho primogênito quem mais se aproveitou desse período para ampliar seus limites de liberdade, que já se tornara considerável devido as constantes ausências do pai. Foi nessa época que Jim conheceu Fud Ford, um colega gorducho com quem aprontava traquinagens, como ir até a casa de praia de uma colega para observar ela e sua mãe trocando de roupas tomar as garrafas de gim do Sr. Morrison e substituir o conteúdo por água, sem contar as intermináveis tardes que passava na casa de Fud Ford dando trotes telefônicos e escrevendo textos radiofônicos como "as dificuldades do enrrabamento e da masturbação". Foi ai que Jim também descobriu o livro On The Road, de Jack Kerouac, grande influência sobre ele, que adotou uma atitude beatnik de vida e mergulhou em obras de escritores como Lawrence Ferlinghetti, Allen Ginsberg, Gregory Corso e outros.

Em fins de 1958, a família de Jim mudou-se novamente, desta vez para o estado da Virginia, na Costa Leste, pois seu pai voltara a trabalhar no Pentágono. Durante os três anos seguintes, Jim moraria na cidade de Alexandria, onde conheceu Tandy Martin, sua primeira namorada, com quem viveu num tempestuoso interlúdio, tanto pela crueldade das brincadeiras de Jim quanto pela imprevisibilidade de suas atitudes, chegando certa vez a ameaçar fazer uma cicatriz no rosto dela com uma faca para que ninguém mais a olhasse, exceto ele.

Porém paralelamente a esse comportamento intempestivo, Jim demonstrava-se brilhante no colégio, destacando-se com excelentes notas, ao mesmo tempo que começou a freqüentar a Biblioteca do Congresso e a devorar dezenas de livros. Entre as suas predileções estavam a filosofia grega antiga, o filósofo alemão Friedrich Nietzsche, poetas americanos como Walt Whitman e Dylan Thomas e a vertente maldita da prosa e poesia francesas, descendente direta das obras de Charles Baudelaire, representada pelos livros de Guillaume Apollinaire, Paul Valéry, Verlaine e, principalmente, Jean Arthur Rimbaud, com quem Jim mais se identificou os seus primeiros escritos. Nesta época ele pensava em tornar-se escritor e poeta e começou a colaborar com pequenos ensaios para um jornal diário, alem de ocasionalmente também se dedicar à pintura. Outra forma de expressão que começou a despertar paixão em Jim foi o Blues combinado com as técnicas vocais dos dois cantores que mais admirava: Elvis Presley e Frank Sinatra.

Com varias atividades, o interesse de Jim pelos estudos decaiu completamente e, quando ele anunciou sua decisão de abandonar o colégio antes de terminar o curso, seu pai repreendeu furiosamente e decidiu o mandar de volta para a Flórida, para que concluísse lá seus estudos. E, em setembro de 1961, Jim voltou a morar com seus avós paternos em Clearwater, enquanto o resto da família Morrison se mudou para San Diego, na Califórnia. É claro que os velhos agüentaram por pouco tempo as insolências, a aparência e os hábitos pouco convencionais de seu neto, e logo Jim decidiu morar em uma casa com mais cinco colegas. Foi quando começou a estudar a fundo Sociologia, História e Literatura, além de ter se dedicado também ao teatro. Foi em Clearwater que conheceu também Mary Frances, uma recatada garota católica conquistada pelo estilo diferente da vida de Jim, e que tomou o lugar de Tande em suas afeições. Seu temperamento irascível então já era regado por doses generosas de álcool, o que fez com que seus colegas de moradia o fossem abandonando um a um, até só restar ele, quando então passou a viver em um pequeno trailer. Um dos poucos amigos que tinha nessa época era Bryan Gates, com quem - a exemplo dos personagens dos escritores beat - fez inúmeras vagens de carona pelo Texas, Arizona e até pelo México. Em uma dessas viagens, Jim teve um destino certo: a casa de seus pais em San Diego.

Steave e Clara assustaram-se menos com os cabelos compridos e a aparência desleixada de beatnik de seu rebento do que com o fato de ele anunciar ter a intenção de estudar cinema na UCLA, a universidade de Los Angeles. Não era exatamente o futuro que tinham planejado para Jim, mas, dada a sua insistência, aquiseram, e, em janeiro de 1964, Jim conseguiu sua transferência para o departamento de cinema da UCLA. O corpo docente na época contava com nomes como os dos cineastas Josef Von Stamberg, Stanley Kramer e Jean Renoir, e entre os nomes figurava o nome do jovem Francis Ford Coppola (que posteriormente realizaria o clássico Apocalypse Now, com a anatológia seqüência de abertura ao som de "The End" dos Doors), mas no restrito grupo de amigos de Jim a principio destacavam-se Dennis Jakob (que mais tarde seria assistente de Coppola em Apocalypse Now) e John LaBella. O trio, além de cinema, tinha interesses em comum em literatura e música. Foi com Dennis que Jim teve a idéia de formar um duo musical com chamado The Doors: Are Open and Closed". O nome se referia aos versos de William Blake - "There are things are known and things that are unknown; in between are doors" (Existem coisas conhecidas e coisas desconhecidas; entre elas há portas) e "If the doors of perception were cleansed, everything would appear to man as it truly is, infinite" ( Se as portas da percepção fossem purificadas, tudo aparecia ao homem como é na verdade, infinito) -, que por sua vez inspiraram o nome do livro As Portas da Percepção, no qual Adous Huxley aborda suas experiências com mescalina. Mas o interesse de Jim pela poesia não havia sido abandonado, e durante a sua temporada na UCLA rabiscava versos e anotações sobre cinema, que depois integrariam seu primeiro livro de poemas, The Lords: Not On Vision, ao mesmo tempo em que preparava uma curta metragem em preto-e-branco e em 16mm para seus exames finais, que se tornaria seu primeiro e único filme. Para isso ele contava com a colaboração de John LaBella como cameraman, e foi através dele que Jim veio a conhecer Ray Manzarek.

Este é o começo... - Uma tagetória igualmente sinuosa, porém bem diversa de Jim, era a que tinha levado Raymond Daniel Manzarek a estudar cinema em Los Angeles. Nascido em Chicago em 12 de fevereiro de 1935, ele teve uma educação clássica no piano desde criança, mas só começou a se interessar realmente pelo instrumento aos doze anos, quando por conta própria aprendeu a tocar boogie-woogie. Isso o levou durante a adolescência a se apaixonar pelos blues que fervilhavam nos guetos e clubes noturnos da cidade, mas teve que deixar a música de lado para se dedicar ao curso de Economia. Já formado, ele veio para a UCLA para estudar Direito, mas logo desistiu, e depois de trabalhar seis messes com bancário, voltou para a Universidade com o objetivo de estudar cinema. Mas, em dezembro de 1961, abalado por uma desilusão amorosa, Ray decide se alistar no Exército, um gesto irrefletido que o levou a servir por longo tempo - do qual, para conseguir a dispensa com um ano de antecedência, Ray teve que se declarar homossexual perante um psiquiatra da corporação - antes de voltar às aulas de cinema na UCLA. Para sustentar seus estudos, nas noites de sexta e sábado, Ray se transformava em Scresmin'Ray Daniels, o vocalista dos Rick & The Ravens, um grupo nitidamente influenciado pelo blues de Chicago e que contava com Rick e Jim Manzarek - irmãos de Ray - no piano e na guitarra, respectivamente. Eles animavam os fins de semana do bar Turkey Joint West, ponto de encontro dos estudantes da UCLA, que freqüentemente terminavam a noite em cima do palco, bêbados, entoando velhas canções com a banda. Uma turma na qual Morrison sempre tinham presença garantida.

No Natal de 1964, Jim viu seus pais pela última vez, pois, logo após, o então Steave Morrison foi designado para ir a Londres, servir nas forças Americanas instaladas na Europa. Durante muitos anos Jim sempre se referia a eles com se estivessem mortos, não estabelecendo nenhuma espécie de contato. Também a situação com sua companheira, Mary - que viera de Clearwater para L.A. com o intuito de se tornar dançarina -, se complicara devido as constantes brigas e porres de Jim. A gota d’água para ele veio com a péssima repercussão de seu filme sem título - uma colagem desconexa de ruídos, sons e imagens, classificado por ele próprio como "um ensaio filmado" - obteve durante a sua primeira apresentação, em maio de 1965. O desprezo com que seu trabalho foi encarado tanto pela maioria de seus colegas quanto pelos professores, (que classificaram como "o pior filme que já tinham visto") fez com que o ressentido Jim desistisse de terminar o curso. Então ele decidiu ir passar um tempo na praia de Venice, perto de Santa Monica, antes de ir para Nova York tentar a sorte, mas foi chamado às pressas por Ray com uma proposta: substituir o músico desistente dos Rick & The Ravens - pois o contrato estipulava que eles deviam se apresentar com seis elementos - na abertura de um show para a dupla Sonny & Cher. Jim terminou tocando com eles, executando uma guitarra desplugada. Depois Jim mudou-se para Venice, a princípio morando com Dennis Jakob, para depois ir viver num sótão de um armazém. Nesse período de aproximadamente três messes, no qual tomava doses maciças de LSD, Jim dedicou-se a desenvolver o conceito de uma banda e de um espetáculo no qual pudasse cantar suas próprias canções, que vinha compondo com afinco. Em uma bela tarde de agosto, Jim encontrou-se com Ray na praia e este pediu-lhe para que cantasse uma de suas músicas. Ele vocalizou os primeiros versos de "Monlight Drive" - (Vamos nadar para a lua/ Vamos subir através da maré/ Penetrar na noite que a cidade dorme para esconder") -, que maravilharam Ray tanto como a proposta de Jim formarem uma banda juntos. Com o nome emprestado do irrealizado com Dennis, Jim e Ray formaram o embrião dos Doors.

O ponto de partida dessa nova banda seria os três irmãos de Manzarek, porém eles não tinham um baterista nem baixista fixo. Ray que por influência dos Beatles havia aderido à filosofia de Maharish Yogi, encontrou em seu centro de meditação John Paul Densmore, que aceitou seu convite para integrar-se ao grupo. Natural de Santa Monica, Califórnia, onde nasceu em primeiro de 1944, John desde criança esteve envolvido com música, tocando percussão sinfônica durante o colégio depois dedicando-se ao jazz. Sua única experiência como baterista de rock havia sido uma rápida passagem por um obscuro grupo chamado The Psychedelic Rangers, mas mesmo assim decidiu juntar-se a nova banda, apesar de ter estranhado as canções de Jim. Com esse time - acrescido de uma baixista desconhecida - e após duas semanas de ensaio, eles entraram em um pequeno estúdio onde, ainda como Rick & The Ravens, os irmãos Manzarek haviam gravado um single (que não chegou a ser lançado). Em três horas de tempo disponível conseguem gravar seis músicas que Jim havia composto naquele verão. De posse das matrizes, Jim, John e Ray e até mesmo sua namorada, Dorothy Fujikawa, começaram a percorrer as gravadoras que não demostraram o mínimo interesse pelo trabalho. Não demorou muito para que os irmãos de Ray e a misteriosa baixista logo debandassem. Foi nessa época que Jim encontrou Pamela Courson - uma garota ruiva de dezoito anos, natural da Califórnia -, com quem ele desenvolveria um intenso relacionamento amoroso durante os anos seguintes. E, mesmo para o grupo, as coisas pareciam melhorar com a inclusão de Robert Alan Krieger como guitarrista definitivo dos Doors. Robby, nascido em L.A. em 8 de janeiro de 1946, havia tentado aprender trompete e piano antes de se dedicar a guitarra flamenca por volta dos dezessete anos. Logo havia trocado-a por uma elétrica, em que a partir do blues e do rock'n'roll desenvolveu uma técnica acurada, especialmente no uso do battleneck. Ele fazia parte da mesma classe de meditação de Ray e John no centro Maharish, além de já ter tocado com o último no grupo The Psychedelic Rangers. Já como quarteto, els pensaram em incluir um baixista na banda e testaram vários músicos, sem um resultado satisfatório.

O problema foi resolvido quando Ray conseguiu um piano elétrico Fender baixo, com o qual fazia as vezes do baixista usando a mão esquerda, enquanto executava seu órgão Vox com a mão direita.

Mother, I want to... - Os Doors haviam fechado um malfadado contrato com a Columbia - a única a se interessar pelas demos do grupo -, através do qual não receberam nenhum apoio e estavam com dificuldades de arranjar lugar para tocar, quando finalmente conseguiram arranjar uma temporada de quatro messes numa biboca chamada London Fog, na Sunset Boulevard, a menos de cinqüenta metros da Whiskey-a-Go-Go, um dos mais importantes clubes de rock de L.A. Durante quatro messes, o ritimo de trabalho da banda era tocar seis noites por semana com sete entradas de 45 minutos por noite, que os obrigou a ampliar o repertório com covers - das quais algumas como "Gloria", de Van Morrison; "Back Door Man" e "Little Red Rooster", de Willie Dixon; e "Who do You Love" - que também foram posteriormente incorporadas de forma definitiva aos shows dos Doors. O ínfimo cachê que recebiam de nada valia, se comparada a experiência de palco adquirida pela banda e, de forma singular, por Jim, que a cada apresentação ia gradativamente abandonando sua postura reservada para se soltar em performances mais e mais incendiárias.

Mas o melhor ainda estava por vir, quando na última noite de sua temporada, a agenciadora de shows do Whiskey-a-Go-Go, Ronnie Haran, veio ver os Doors no London Fog e, fascinada por Jim, decide contratar o grupo como a banda da casa, para abrir as apresentações de grupos como o Love, The Byrds, Them e The Seeds, entre outros que tocassem no Whiskey. O contato com os Doors foi difícil, pois nenhum deles tinha telefone (na época Jim dormia na praia), mas, afinal, em meados de maio eles estrearam na nova casa em uma conturbada temporada que duraria aproximadamente um mês. Isto porque grande parte de seus shows tinham de ser interrompidos pelos donos do local, fosse por eles estarem tocando em níveis ensurdecedores, fosse porque os músicos estivessem bêbados ou chapados demais. Estes constrangimentos eram contornados por Ronnie e, entre vários apoios que ela deu ao grupo, talvez o mais importante tenha sido o fato de ter levado o presidente da gravadora Elektra, Jack Holzman, a assistilo-os. Holzamn não gostou do que viu pela primeira vez, mas aos poucos foi enxergando potencialidades nas estranhas canções dos Doors e resolveu contrata-los. Ele recomendou ao produtor Paul A. Rothschild que fosse ve-los, e este ficou impressionado com a energia das músicas dos Doors e também com as delirantes improvisações a que se entregavam em temas mais longos como "Light My Fire", "When The Music's Over" e, especialmente, em "The End" . Mal sabia que ele poucos dias depois, essa última música seria a causa da demissão sumária do grupo.

Talvez a mais intrigante composição dos Doors, "The End", tenha sido originalmente concebida para ser uma simples "canção de adeus", apenas com o primeiro verso e o refrão, mas aos poucos foi sendo expandida ao sabor da guitarra etérea de Robby e das novas imagens criadas por Jim na letra. Naquela última noite no Whiskey-a-Go-Go, Jim - que não havia se apresentado na primeira entrada por estar totalmente alucinado de ácido - decidiu subir na segunda e encerrou-a com "The End". Foi a primeira vez que ele deu à canção o seu formato final, recitando seu famigerado trecho edipano: (O assassino acordou antes do amanhecer/Calçou as botas/Tirou um rosto da antiga galeria/E caminhou pelo corredor/Foi até o quarto onde sua irmã vivia/E depois visitou o seu irmão/ E depois caminhou pelo corredor/ E chegou até a porta/ E olhou para dentro/ Pai/ Sim, filho/ Quero ....../ Mãe quero ......"). Em seguida a essa parte, Jim acrescentou um portentoso "...... .......", agregado a um cataclisma sonoro detonado pelos instrumentos que então retornavam a sua melodia original até a conclusão do barítono cavernoso de Jim proclamando: "This is the end"

Após a execução, não houve qualquer reação do publico, que permaneceu estupefato em um longo silêncio, que só foi quebrado gradativamente pelo movimento no bar e as conversas nas mesas. Por seu lado, os proprietários do Whiskey-a-Go-Go enxotaram a berros de fúria os Doors de seu estabelecimento. Mas este não foi o fim, pois logo nos primeiros dias de setembro de 1966 o grupo estaria no estúdio Sunset Sound - em companhia do produtor Paul e do engenheiro de som Bruce Botnick - para iniciar as sessões de gravação de seu disco de estréia. As portas da glória começariam a se escancarar para Jim, Ray, Robby e John.

NÓS QUEREMOS O MUNDO E O QUEREMOS JÁ!

(parte 2)

Nove músicas próprias e covers para "Back Door Man", do bluesman Willir Dixon, e "Alabama Song (Whiskey Bar)", parceria do teatrólogo alemão Bertolt Brecht com Kurt Weill: este foi o repertório escolhido pelos Doors para constar de seu primeiro álbum. Outras, como "Moonlight Drive"(a primeira canção do grupo, que seria regravada para o LP posterior), chegaram a ser gravadas, mas os Doors e o produtor Paul A. Roschild decidiram concentrar esforços nestas onze faixas, supra-sumo do material registrado. Deste rol faziam parte: Light my Fire (o maior sucesso comercial dos Doors, que apesar de ter sido creditado ao grupo é de autoria quase exclusiva do guitarrista Robby Kieger) algumas composições mais antigas como "I Looked At You", "End Of The Night" e "Take As It Comes", além de músicas mais elaboradas, como "Break On Through", "Soul Kichen" e é claro, "The End".

Sem praticamente nenhuma experiência em estúdio, os Doors encontraram na produção de Paul e no trabalho do engenheiro de som Bruce Botnick os perfeitos complementos para transpor sua sonoridade agressiva para o vinil. O álbum foi gravado em quatro canais, pois, apesar de já existirem estúdios de oito desde os anos 50, eles eram raros e estouravam qualquer orçamento na Califórnia de 1966. Mesmo assim, o resultado obtido foi brilhante, na interação dos vocais de Jim com os instrumentos, conseguida com o mínimo de recursos e que logrou contornar sérias dificuldades, como o fato de o grupo não usar baixo, através de overdubs dos teclados de Ray. Porém, apesar dos Doors terem feito as bases instrumentais de quase todas as faixas em dois ou três takes, o problema maior residia na participação de Jim, quase sempre chapado demais para acrescentar os vocais.

Ainda que não estivesse consumindo drogas em doses enormes, como faria pouco depois, Jim já se mantinha quase sempre bêbado e louco de ácido. Isso fez com que várias das sessões de gravação tivessem que ser interrompidas, e, dentre as músicas do grupo, a de mais angustiante finalização tinha de ser "The End". Jim estava tentando arduamente achar a forma ideal de enquadrar os versos da canção, e numa madrugada chegou ao estúdio obcecado por esse problema, pôs-se nu e começou a atirar areia de um cinzeiro e a espuma de um extintor de incêndio sobre os instrumentos e equipamentos, sendo retirado de lá pelo produtor Paul. Foi ele que depois descreveu como "um momento mágico" o registro final de "The End", com todas as luzes apagadas, exceto pelos indicadores de V.U. da mesa de som e uma vela na cabine de Jim. Apesar de todos os contratempos, o álbum foi gravado em apenas duas semanas, tendo sido necessárias mais de cinco para a mixagem. Depois disso, os Doors seguiram para Nova York, onde fizeram algumas apresentações muito bem recebidas, inclusive no famoso clube Ondine's, freqüentado por Andy Warhol e o pessoal de seu superateliê, Factory, antes de retornarem a L.A. para o lançamento do LP.

The Doors foi editado em janeiro de 1967 e, ao lado de The Velvet Undergound With Nico Produced By Andy Warhol, que saiu dois meses depois, talvez sejam os dois mais impressionantes álbuns de estréia concebidos durante os anos 60. Apesar das concepções sonoras diferentes - enquanto o Doors se pautavam em um instrumental com raízes no jazz e no blues, o Vevet Underground desenvolvia uma sonoridade mais caótica, a cargo de guitarras mais "primitivas" de Lou Red e Sterling Morrison e da viola de John Cale -, a abordagem dos temas e o clima de suas canções (especialmente as mais longas) uniam os dois grupos em uma "irmandade" que se opunha frontalmente ao "paz e amor" reinante. Eram como dois corpos alienígenas, mesmo dentro da profusão de fraks do famigerado "Verão do amor" de 1967, tanto na Califórnia como em Nova York. Jim já havia ouvido com entusiasmo o som do Velvet durante a tour do Exploding Plastic Inevitable pela costa oeste em maio do ano anterior e pecebido a afinidade entre o trabalho deles e o que ele iniciava com os Doors. Em meados de 1967, esta aproximação extrapolaria as esferas musicais, com Jim mantendo um rápido e turbulento afair amoroso com Nico, a glacial chanteuse que acompanhava o Velvet.

Mas houve uma diferença fundamental entre os dois grupos, decorrente da aceitação de seus álbuns: se o "disco da banana" do Velvet foi um fracasso de vendagem cultuado somente por um punhado de admiradores, os Doors viam o segundo single retirado do LP - "Light My Fire", lançado em abril - entrar para as Dez Mais Da Billboard no fim de julho e um mês depois de alcançar o primeiro lugar. Em agosto "Light My Fire" havia chegado à marca de um milhão de cópias, e o LP The Doors, a um milhão de dólares de vendas. Enquanto isso, a partir de alguns shows no eixo L.A.- San Francisco os Doors enpreenderam uma tour nacional de avassalador sucesso, em que começaram a ocorrer os primeiros "pequenos incidentes" com Jim (que em um concerto em Long Island ameaçou tirar a roupa no palco, para pânico dos donos do local). Aliado a esse vertiginoso sucesso, a imagem da rebeldia de Jim à frente dos Doors começava a se projetar nacionalmente por suas aparições em programas de TV como os de Jonathan Winters e Ed Sullivan (este com uma audiência de dez milhões de espectadores). A mídia atribuía-lhes uma imagem de "resposta americana aos Beatles e aos Stones", e a partir do fim de 1967, publicações como Newsweek, Time, life e Vogue passariam a dedicar páginas e páginas ao culto de Jim o "sonho americano", Este frisson logo incrementou as vendagens do segundo álbum do grupo: Strange Days, lançado em outubro.

Uma nova gama de inovações foi incorporada pelos Doors em sua segunda incursão pelo estúdio: para começar eles tiveram à sua disposição oito canais de gravação, que possibilitavam uma maior liberdade de criação, alem de uma instrumentação mais requintada, na qual as linhas do baixo, originalmente executadas pelos teclados de Ray, foram substituídas pelas do instrumento de cordas ( no caso por Doug Lubahn, o primeiro de uma série de baixistas usados pelos Doors em suas gravações posteriores). Neste contexto experimental surgiram faixas como "Strange Days" (um dos primeiros usos do sintetizador Moog no rock), "Unhappy Gril" (com os inusitados teclados de Ray e o chimbau invertido tocado por John) e de forma especial os longos e envolventes climas de "When The Music's Over" (herdeira direta de "The End") e em "Horses Latitudes" (na qual Jim recitava um antigo poema seu sobre uma base de "música concreta" improvisada pelas pessoas presentes no estúdio, batendo garrafas, latas de lixo e cascas de coco nos ladrilhos do chão, entre outros ruídos). Desta feita, todo material foi assinado pelo grupo, e das dez músicas do disco, duas tinham letras compostas pelo guitarrista Robby: "Love Me To Times" e "You're Lost Little Gril".

Menos de dois messe depois do lançamento de Strange Days, Jim foi retirado do palco por policiais durante uma apresentação em Newhavem, Connecticut: durante a execução de "Back Door Man" ele começara a descrever de forma sarcástica um episódio ocorrido pouco antes nos bastidores, no qual um policial borrifara seu rosto com um spray de gás lacrimogêneo. Jim foi autuado por distúrbio da ordem e resistência à prisão, sendo solto logo depois sob fiança. No início de 1968, ele estava novamente envolvido de forma pesada com LSD e bebidas, o que no entanto não o impediu de conceber planos mais audaciosos para o grupo. Dois singles - "The Unknown Soldier" e "Hello, I Love You", lançados em março e julho, respectivamente - apenas prenunciavam o que conteria o terceiro disco dos Doors. Na concepção de Jim, seria um álbum duplo, com um dos seus lados dedicado inteiramente à suite "The Celebration Of The Lizard", um longo poema escrito por ele e musicado pelo grupo, na qual reafirmava sua fascinação por répteis (como em alguns versos de "The End") e que lhe valeu a alcunha de Rei Lagarto. Porém, tanto o resto do grupo como o produtor e engenheiro de som (novamente Paul e Bruce) mostraram-se insatisfeitos com os resultados obtidos não só com "The Celebration" como também com outras recentes composições dos Doors, depois de exaustivas sessões de estúdio. A solução foi recorrer a antigas canções como ("Hello, I Love You" e "Summer's Almost Gone") e criar novos arranjos (como os vocais de capela de "My Wild Love", improvisados no próprio estúdio) para tomar o lugar das faixas rejeitadas. Uma delas , "Waiting For The Sun" (posteriormente regravada no LP Morrison Hotel), é que acabaria dando o nome ao álbum, a princípio intitulado American Nights e depois de The Celebration Of The Lizard, idéia deixada de lado pelo fato de que só um pequeno excerco desta suíte ("Not To Touch The Earth") foi incluído no disco.

Pouco antes do lançamento de Waiting For The Sun, os Doors começariam com um show de gala na noite de 5 de julho de 1968 no Hollywood Bowl, a primeira de uma série de excursões ocorridas, porém tumultuadas. Depois de tocarem no Texas e no HavaÍ, eles se apresentaram - junto com o The Who - no gigantesco Singer Bowl, em Nova York, num trágico show durante o qual centenas de pessoas da platéia e policiais ficaram feridos durante um grande confronto. Os problemas continuaram na tour Européia de três semanas feita pelo grupo na seqüência: em contraponto ao espetacular sucesso de sua passagem por Londres, em um dos shows em Frankfurt os Doors tocaram como um trio, com Ray assumindo os vocais, pois Jim teve que ser internado às pressas em um hospital, por ter passado um dia inteiro se embebedando e comendo pedaços de haxixe. A sua relação com as drogas não tinha o carácter introspectivo daquele de sua companheira - Pamela Cuerson, que na época começara a se utilizar de heroina -, mas era uma porta de expansão para sua personalidade intempestiva, que freqüentemente se atirava nos mais incríveis excessos. Mesmo na ribalta, tais excessos as vezes custavam caro a Jim, como em um show no dia primeiro de novembro, em L.A., onde, depois de dirigir provocações à platéia, ele quase foi alvejado por fogos de artifício.

As atitudes incendiárias de Jim no palco fariam dos primeiros messes de 1969 um período capital na história dos Doors. Interessado de longa data no trabalho experimental desenvolvido pelo dramaturgo francês Antonin Artaud, Jim teve a oportunidade de participar de um espetáculo de descendentes diretos de Artaud: o Living Theatre de Julian Beck e Judith Molina. A idéia de Jim foi de aplicar os mesmos métodos chocantes e provocativos para aumentar ainda mais o impacto das apresentações dos Doors. A cristalização desse procedimento deu-se durante um fatídico show em Miami, Florida. Jim, que a tempos vinha cultivando uma cerrada barba, assumira um ar mefistofélico muito distante de sua imagem de "o sonho americano". Naquela noite depois de insultar insistentemente a platéia com coisa do tipo "vocês são um bando de idiotas fudidos", ele abaixou as calças e simulou estar se masturbando, alem de ter insinuado um fellatio com o guitarrista Robby, entre outras amenidades. No dia seguinte, Jim, Ray, John e Robby, acompanhados de suas respectivas namoradas - Pamela, Dorothy, Julia e Lynn -, partiram para o Caribe em férias, bem a tempo de Jim escapar de uma ordem de expedida contra ele por "comportamento indecente, exibicionismo, linguagem obscena e bebedeira".

O "caso Miami" rendeu um sem-número de especulações sensecionalistas a respeito de Jim. Os Doors começaram a ter uma série de apresentações canceladas, e, devido à sua repercusão, a questão acabou chegando até a alçada do FBI. Em 4 de abril, Jim se entregou à justiça aconpanhado de seu advogado, sendo liberado logo depois sob fiança de cinco mil dólares. Este seria o primeiro passo de um penoso e interminável processo que terminaria dois anos depois, até ser encerrado pela morte de Jim. Mas os problemas com a lei momentaneamente ficaram para trás, tendo em vista a estréia de um filme (Fiest of Frends) e a conclusão de outro (HWY) - realizado pelos Doors junto a Paul Ferrara, Frank Lisciandro e Babe Hill, antigos colegas de Jim e Ray no departamento de Cinema na UCLA -, e também o lançamento de The Doors Are Open, documentário centrado em uma antológica performance do grupo em Roundhouse, em Londres. Foi também com satisfação, que nesta época, Jim viu seu segundo livro de poesias - The New Creatures, dedicado à Pamela - ser publicado em edição limitada assim como o anterior (The Lords/Notes On Vision). Mas júbilo maior ficou por conta dos Doors, quando em junho praticamente haviam terminado as complicadas sessões de gravação de seu quarto LP, que já se estendiam por mais de seis messes.

Com o lançamento de The Soft Parade, ficaram comprovadas mudanças sensíveis na concepção do grupo. A começar pelo crédito das músicas que, anteriormente sendo coletivos, foram pela primeira vez imputados individualmente e divididos de maneira salomônica entre Jim e Robby. No plano musical ocorreu uma nítida sofisticação nos arranjos, com o uso ostensivo de cordas e metais, que chegava às raias de descaracterizar a crueza do som do grupo. É claro que ainda destacavam o brilho de algumas canções de Jim ("Shaman's Blues" e "Wild Child") e Robby ("Touch Me" e "Runnin' Blue", esta dedicada a Otis Redding), mas, no cômputo geral, o resultado ficou aquém das expectativas, com possível exceção para a longa faixa- título escrita por Jim, a que mais se aproximava em faixas de criatividade, da produção anterior do grupo. Acolhida de crítica e público foi um tanto recitente, mas mesmo assim - com a polêmica sobre "caso Miami" parcialmente errefecida - os Doors conseguiram confirmar vários shows e saíram em uma tour, cujo o roteiro compreendia desde Toronto, no Canadá, até a Cidade do México, atravessando os EUA. Nos palcos, um Jim de rosto barbeado e um pouco mais contido, o que não impedira dele seu comportamento irascível lhe causasse uma série de problemas com a lei, pelos mesmos motivos de sempre.

Os planos da gravadora Elektra eram que alguns destes shows fossem gravados para que um disco ao vivo pudesse ser lançado antes do fim do ano, mas o projeto foi vedado pelo grupo, que decidiu se dedicar a preparação do material do próximo álbum de estúdio. Desta forma, no começo de Janeiro de 1970, foi lançado Morrison Hotel, um LP que resgatava uma vitalidade não registrada pelos Doors em estúdio desde Strange Days. Pelos dois lados do disco - o primeiro batizado de "Hard Rock Café" e o segundo como "Morrison Hotel" - transbordava uma energia exuberante, não só nos números mais pesados, como "Roundhouse Blues" (com a gaita de Giovanni Pugliese, também conhecido por John Sebastian) e "You Make Me Real", mas também em pungentes baladas como "Blue Sunday" e "Indian Summer". Isso sem contar com a verve poética e a voz de Jim, que voltaram à sua melhor forma. O disco foi bem recebido, e logo os Doors voltaram a excurcionar, enquanto Jim teve seus dois primeiros livros de poesia republicados em grande escala pela Simon & Shuster, de Nova York, ao mesmo tempo em que triava uma editagem limitada um terceiro: An American Prayer. Por outro lado, a maldita sina dos concertos dos Doors cancelados por causa da má reputação de Jim continuava a persistir, agravada pelos impasse gerado pelos constantes adiamentos do "caso Miami" e outros "delitos menores".

Sob essas circunstâncias, Jim decidiu passar algum tempo em París, terra de Bauldelaire, Rimbaud e outros mentores de seu estilo poético, para manter-se afastado um pouco do cenário do rock e fazer planos para o futuro. Antes fechou um contrato verbal com a MGM para atuar e participar do roteiro e da produção de dois filmes (The Adept e Cork), projetos nunca concretizados. Foi, então, que aconteceu um dos acontecimentos mais insólitos da vida imprevisível de Jim: de passagem por Nova York para levar alguns tapes ao vivo dos Doors para serem remixados, reencontrou Patrícia Kennely, editora do magazine Jazz & Pop, que conhecera durante uma entrevista há pouco mais de um ano. De súbito, decidiu se casar com ela antes de embarcar para a Europa, o que se deu em uma excêntrica cerimônia no apartamento gótico-vitoriano de Patrícia, seguido dos rituais de feitiçaria de uma ceita que ela seguia.

Viajando de París para a Espanha e depois para o Marrocos, Jim retornou a L.A. em julho, pouco antes do lançamento do álbum duplo Absolutely Live. Este trazia como novidade as faixas ao vivo de músicas até então nunca registradas em vinil, como "Build Me A Woman", "Universal Mind" e "Love Hides", junto a covers inéditos de Bo Diddley ("Who Do You love") e Willie Dixon ("Close To You"), além da única versão integrada editada oficialmente da suíte "The Celebration Of The Lizard". Durante dois messes seguintes, Jim - que deixara crescer a barba novamente - foi convocado para sucessivas audiências no tribunal de Miami, ao mesmo tempo em que ficou sabendo que Patricia estava grávida. Para acentuar ainda mais a sua depressão, ele viu a segunda tour que os Doors fariam na Europa ficar reduzida a uma única e desastrosa apresentação na Ilha de Wight, em 29 de agosto. Angustiado por essa situação, Jim se afundava novamente no álcool e nas drogas pesadas, como a cocaína - que ele começara a consumir com avidez há pouco mais de um ano -, a heroina, na qual iniciara-se por influência de Pamela, antes que uma briga entre ambos a fizesse mudar para Paris.

As coisas só começariam a melhorar no fim do ano, quando Patricia atendeu aos insistentes pedidos de Jim e fez um aborto. Ao mesmo tempo, a Elektra lançava a compilação 13 e dava um sinal verde para que os Doors iniciassem as gravações de um novo álbum. Além disso na data de seu vigésimo sétimo aniversário (08/12/70), Jim conseguiu junto à gravadora a cessão de algumas horas de estúdio, as quais dedicou a gravação de trechos de seu livro An American Prayer (um material que seria lançado postumamente em 1978, em um LP hormônimo, no qual os textos recitados por Jim foram agregados a um fundo musical executados pelos três membros remanescentes do grupo). No início de 1971, as coisa estavam ainda melhores para Jim, com Pamela tendo voltado de Paris para se reconciliar com ele e os Doors embalados com força total na elaboração de L.A. Woman. A idéia era fazer um ábum profundamente enraizado no blues gravando os instrumentos e os vocais ao vivo no estúdio - que no caso era o próprio local de ensaios deles - e com o mínimo de overdubs. Para completar o time, eles chamaram Jerry Scheff (ex-baixista da banda de Elvis) e Marc Brenno (que participou de algumas faixas como guitarrista base). Desta forma, foram gravados vários números ligados a tradição do blues ("Been Down So Long", "Cars His By My Window" e até "Crawling King Snake", de John Lee Hooker) e canções mais próximas do estilo musical dos Doors, como "The Changeling", "L.A. Woman", " L'America", que fora excluída da trilha de Zabriskie Poit, de Antonioni, além do tempestuoso clíma de "Riders On The Storm".

Esta última música havia sido a gota d'agua na relação - que já estremecia desde as gravações de Morrison Hotel - dos Doors com o produtor Paul A. Rothschild, que depois de ouvi-la classificou como "música de coquetel". Na verdade, Paul não tinha em absoluto compartilhado do entusiasmo do grupo em relação a seus novos trabalhos e se retirou sumariamente da produção, cabendo ao engenheiro da som Bruce Botnick, associado aos próprios Doors, a tarefa de terminar o LP. Nem mesmo Jim esperou a conclusão das mixagens e, no começo de março, viajou para Paris para encontrar Pamela, que pouco antes tinha seguido para lá. Um mês depois, o álbum foi lançado e, mesmo alcançando níveis iniciais razoáveis de vendagem, não conseguira decifrar a incógnita em que se transformara o futuro dos Doors. Afinal, este era o último disco previsto pelo contrato da Elektra, e, de seu exílio voluntário em Paris, Jim tinha várias dúvidas quanto continuar sua trajetória de rock star ou mergulhar de vez na poesia e literatura.

Este dilema manteve-se sem solução, com a morte repetina de Jim em 3 de julho. Foi o ponto final de uma existência repleta de todos os os tipos de excesso, dos mais vitais aos mais letais. Sua companheira, Pamela, não demorara a seguir o mesmo caminho, morrendo de overdose de cocaína menos de três anos depois. Quanto aos outros membros do grupo, a princípio incentivados pelo selo Elektra, tentaram levar adiante a lenda dos Doors tocando como trio, com Ray e Robby revezando-se nos vocais. Os esforços eram em vão, pois a porta principal já estava fechada. Depois do LP Other Voices (lançado em novembro de 1971), onde ainda algums lampejos de inspiração salvaram-se no meio às fracas composições, o trio ainda cometeu em julho de 1972 o álbum Full Circle, um hediondo epitáfio para a carreira tão espetacular como a dos Doors. Era triste mas verdadeiro, o círculo estava completo. Ascensão, glória e declínio.

Nunca mais, fossem como músicos ou produtores, as três "portas" sobreviventes conseguiram repetir a intensidade da chama criativa que envolvia o som do grupo na companhia do Rei Lagarto. Talvez seja por isso que seu trabalho, mesmo duas décadas depois, ainda continue resplandecendo. Afinal, Jim sabia que a música seria a sua única amiga, até o fim.

Texto retirado do Site The Doors Fã Club On Line - http://www.tecnet.com.br/doors/

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