publicidade

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Geração produtiva de músicos, coincidência ou não, é marcada por fatalidades


Adriana Del Ré - AgÊncia Estado

São Paulo - A morte precoce de Cássia Eller abriu precedentes para uma série de discussões na mídia, inclusive sobre a conturbada geração dos anos 80. Aquela geração produtiva musicalmente, que lançou no mercado fonográfico nomes ainda hoje representativos dentro do rock nacional, como Titãs, Paralamas do Sucesso, Barão Vermelho, Legião Urbana, Capital Inicial e Ira! Nesse cenário em ebulição, havia espaço tanto para os hits bem-humorados de João Penca e Seus Miquinhos Amestrados quanto para as letras contestadoras do grupo Camisa de Vênus.
Na realidade, Cássia passou pela década de 80 no anonimato. Aos 18 anos, tornou-se profissional e se apresentava em bares de Brasília. Fez sua primeira gravação de uma fita demo em 1989. Caiu nas graças da gravadora Polygram e estourou no anos 90. Mas a cantora era contemporânea daquela turma que atingiu seu nirvana na música em meados dos anos 80 e que hoje estão (ou estariam) na faixa etária dos 40 e poucos anos. 

Coincidência ou não, foi uma geração marcada por uma sucessão de fatalidades: a vida dos "poetas" Cazuza e Renato Russo foi abreviada pela Aids; músicos como Lobão e Roger, do Ultraje a Rigor, tiveram sérios envolvimentos com drogas; Herbert Vianna sofreu um grave acidente com ultraleve; Marcelo Frommer, guitarrista do Titãs, morreu vítima de atropelamento, no auge de sua produtividade. As tragédias no meio musical já são históricas, vide as mortes de Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, entre tantos outros.
De acordo com Lucinha Araújo, mãe de Cazuza, a juventude dos anos 80 presenciou a ditadura agonizar e a revolução sexual. "Eles pagaram um preço alto por isso, principalmente no meio artístico", avalia Lucinha, que mantém o projeto Sociedade Viva Cazuza, no Rio, desde a morte do filho. "São pessoas diferentes
com pensamentos diferentes dos outros", acredita.
Criada à imagem da mãe, Lucinha lembra que tentou transmitir ao filho os mesmos princípios rígidos de sua geração - sem sucesso. "Cazuza não aceitou", recorda. "Ele me ensinou que 'quem tem um sonho não dança'; é a mesma coisa que passar pela vida e não sofrer. Eles eram muito corajosos", defende.
Estatísticas
Ex-líder da banda Camisa de Vênus, Marcelo Nova, de 50 anos, acredita que as fatalidades não são características isoladas dos anos 80. "Nas décadas de 60 e 70, pode-se perceber estatisticamente que o número de pessoas que desapareceu por causa de drogas foi maior", defende. Para ele, não se pode generalizar os motivos que levaram aquela geração a ter determinados comportamentos. "Individualmente, existem artistas que se expressam, às vezes, um pouco diferente do que se espera", diz.
Formado em 1980, o Camisa de Vênus surgiu com a única proposta de "esculhambar", como o próprio Marcelo Nova admite. "Não queríamos ter uma carreira, eu não era um poeta, um compositor", diz o músico, que com o fim do grupo, construiu carreira-solo. O Camisa não percorreu a habitual trajetória garagem-barzinho-gravadora antes de obter o sucesso. "O importante era que ninguém fosse músico, que todos tocassem mal", recorda.
Em meio a tantas bandas, Marcelo Nova crê que algumas delas deixaram sua marca. "Naquela época, público e artistas não pensavam que aquele era o momento do rock", conta. Fazendo na época o papel de irmão mais velho daquela "molecada", ele revela que, a princípio, aquela geração não se preocupava propriamente com a produção artística. "Eles queriam desfrutar os prazeres da vida, pegar as meninas e usar drogas", afirma. "Entre 1985 e 86, a moda era o rock, e todos lucraram com isso, o retorno financeiro foi muito bom", revela.
Segundo Lobão, o rótulo de 'geração perdida' é estigmatizado. "Eu sou sempre enterrado vivo com eles, eu estou trabalhando", revolta-se. Ele considera um erro histórico tachar aquela geração dessa maneira. Lobão, de 44 anos, iniciou a carreira nos anos 70, mas seu trabalho obteve repercussão na década seguinte. "Sinto meus ombros sobrecarregados", diz. "Minha maior vitória é estar vivo", afirma.

Publicado no Jornal o Estado do Maranhão em 15 de janeiro

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...